Durante os últimos anos, um curioso fenômeno parecia dominar os corredores do Supremo Tribunal Federal. Em praticamente todas as ações com implicações políticas, disputas ideológicas ou até desavenças familiares que ganhavam contornos midiáticos, o destino era sempre o mesmo: o gabinete do ministro Alexandre de Moraes. Era como se o universo digital dos sorteios estivesse preso em um feitiço, repetindo um único resultado, tal qual um dado viciado que só conhece uma face.
Essa regularidade não passava despercebida. A cada novo sorteio, os olhos atentos da população já anteviam o desfecho antes mesmo do clique final do sistema eletrônico. “Vai cair nele de novo”, diziam os mais céticos. E invariavelmente, caía. Uma espécie de mágica mal explicada, dessas que nem o ilusionismo de Las Vegas ousaria tentar.
No entanto, como diria Sócrates, “o início da sabedoria está na admissão da própria ignorância“. E eis que, subitamente, como se um lampejo de lucidez rompesse a névoa da manipulação, algo inesperado aconteceu. De ontem para hoje, o sistema de sorteio digital do Supremo parece ter sido libertado das garras do automatismo previsível. Sim, pasmem os senhores. Pela primeira vez em muito tempo, os sorteios não foram parar nas mãos do ministro Alexandre de Moraes.
O que teria acontecido? Teria alguém esfregado a lâmpada mágica e feito um pedido sincero por justiça e equilíbrio institucional? Ou será que a pressão popular, o clamor das ruas e o eco dos brados patrióticos finalmente perfuraram os salões de mármore do STF?
Seja qual for a explicação, o fato é que, desta vez, os processos foram parar nas mãos de outros ministros. Nuno Marques, Luiz Fux e André Mendonça, nomes que, para muitos, pareciam até esquecidos dentro daquela Corte, foram os contemplados com as novas ações impetradas. Sim, caro leitor, existem mais dez ministros além daquele que monopoliza os holofotes. Acredite, eles também usam toga, assinam despachos e tomam decisões. Podem acreditar nisso.
Essa simples mudança, aparentemente banal, carrega um simbolismo profundo. A normalidade volta a dar sinais de vida. A roleta jurídica girou de verdade. Pela primeira vez em muito tempo, parece que o acaso voltou a ser acaso, e não instrumento de controle disfarçado de tecnologia.
Mas vamos além do superficial. Não se trata apenas de um sorteio. Estamos diante de um fenômeno simbólico que remonta à essência da República: o equilíbrio entre os poderes, a independência dos magistrados e a confiança no sistema democrático. E essa confiança só pode existir onde há isenção, transparência e, sobretudo, humildade institucional. Algo que, convenhamos, tem estado em escassez no Brasil. Seriam os primeiros passos de volta a normalidade?
Nos últimos anos, vimos a toga ser usada como manto de poder absoluto. Vimos a Constituição ser reinterpretada com base em interesses momentâneos, ideológicos e não em princípios sólidos. Testemunhamos o nascimento de um novo tipo de monarquia, onde um homem só concentra mais poder do que qualquer presidente eleito democraticamente. Para que existe o parlamento, se temos Alexandre de Moraes?
E o mais curioso: sob o aplauso de uma imprensa que deveria ser o cão de guarda da democracia, mas que, por conveniência ou covardia, se tornou o poodle do autoritarismo. Eduardo Bolsonaro é um poeta.
A direita brasileira, muitas vezes demonizada por defender valores tradicionais, foi incansável em denunciar os abusos, clamar por liberdade e exigir o retorno ao devido processo legal. Enquanto parte da população aplaudia censura, prisão preventiva sem prazo e medidas de exceção travestidas de legalidade, conservadores de verdade seguiam firmes, de pé, amando a pátria e respeitando a Constituição que tantos dizem defender, mas poucos realmente leem. O bastião dessa defesa soberana? Méritos para a Revista Oeste e seus corajosos e valentes defensores, homens e mulheres que não se acovardaram e praticavam o jornalismo. Puro. Raiz.
Vivemos um tempo em que o cidadão que levanta a bandeira verde e amarela é tachado de golpista. O mesmo cidadão que trabalha, paga impostos e ensina aos filhos a rezar ou orar antes de dormir. Para esses, restou o silêncio ou o risco de ser alvo de inquéritos obscuros e intermináveis, inquéritos do fim do mundo, que estão com os dias contados, cujo início ninguém entende e cujo fim depende da disposição ideológica do julgador.
Pois bem. A mudança nos sorteios, ainda que sutil, é um sopro de esperança. Um sussurro de que a balança da justiça talvez esteja voltando ao seu eixo. De que o Brasil não pertence a um gabinete, nem a um partido, muito menos a um único intérprete da lei. O Brasil pertence ao seu povo. E o povo brasileiro, quando acorda, não volta a dormir com facilidade.
É preciso questionar: qual é o limite do poder de um juiz? Até onde vai a autoridade legítima e quando ela se transforma em tirania institucional? A toga não foi feita para dar voz aos egos inflados, mas para proteger o cidadão comum. E o cidadão comum, no Brasil, está cansado de ser tratado como inimigo do Estado e tendo a Constituição ‘rasgada’.
Chegamos a um ponto em que a dúvida virou crime. Em que questionar decisões virou motivo para bloqueios bancários. Em que fazer perguntas foi equiparado à incitação ao ódio. Só faltou tipificarem o crime de “pensamento independente”.
Não. Não é assim que se constrói uma nação livre. O Brasil precisa, urgentemente, restaurar o império da lei. E isso só será possível se o Judiciário deixar de lado a vaidade e voltar à sua função original: aplicar a lei, e não a reescrever de acordo com seus humores ou ideologias.
Por isso, caro leitor, fique atento. Um sorteio que finalmente distribui processos de maneira equitativa pode parecer pouco, mas é um bom sinal. Pode ser o início de uma nova era. Ou, no mínimo, o fim de um velho ciclo. A nação observa. E não há algoritmo que resista à força de milhões de olhares atentos.
Que o sistema continue “destravado”. Que a justiça volte a ser plural. E que a pátria reencontre seu caminho entre a fé, a família e a liberdade.
Porque, no fim das contas, a maior sentença que se pode dar é o voto. E o povo já está escrevendo, nas urnas e nas ruas, o veredicto que a história há de registrar.
Léo Vilhena | Jornalista
@LeoVilhenaReal